sábado, 9 de junho de 2012

Mundo da Educação Física

Notas críticas sobre o episódio da morte de jovem na Educação Física em Planaltina


Diante das repercussões sobre a morte de um aluno de escola pública de Planaltina em plena aula de Educação Física, senti, enquanto professor desta área, a necessidade de dar meu posicionamento sobre o caso.
O primeiro ponto refere-se ao tratamento que a mídia e alguns setores da sociedade (oportunistas), como o Sistema CREF/CONFEF, que insistem na busca de um culpado, resultando em um profundo desrespeito à dor da família, a situação da professora, dos alunos adolescentes e dos gestores da escola. A professora e a escola foram condenadas pela “opinião pública” sem que os fatos, que merecem um tratamento mais cuidadoso, tivessem sido apurados. Sendo assim, apontar culpados, antes de analisar o fato é leviano.
Como segundo ponto, gostaria de destacar a relevância de se entender a Educação Física escolar como componente curricular obrigatório de toda Educação Básica, difere-se de espaços de intervenções que tem como objetivo o alto rendimento, que exige esforço físico que justifique a prática da atividade física condicionado a um diagnóstico médico, mais comumente materializado e conhecido como o atestado médico. Esse mito, de se ver a escola como espaço-tempo de formação de atletas sob a ótica do paradigma da aptidão física e do alto rendimento, arraigado no senso comum, impedem uma compreensão mais ampla, crítica e contextualizada de uma disciplina que compreende os elementos da cultura corporal (ginástica, lutas, dança, jogos e esporte) como conteúdos/conhecimentos sistematizados e historicamente construídos pela humanidade pela qual se cumpre a função social da escola na apropriação crítica desses conhecimentos. A superação desse paradigma permite vislumbrar uma Educação Física presente na escola, para além do movimento pelo movimento, mas como práticas construtoras de sentidos e significados para a vida cotidiana e concreta de cada educando. O PAR-Q, por exemplo, é um teste simples, prático e objetivo, que por meio de algumas perguntas “filtra” mais de 90% dos casos que realmente precisam passar por uma perícia médica para o diagnóstico de alguma possível limitação.

Neste sentido, é incabível pensar na desobrigação ou dispensa das aulas de educação Física para “cardiopatas”, surdos, mulheres, deficientes físicos, negros, idosos, deficientes intelectuais, “gordinhos”, “pernas-de-pau”, homossexuais etc. A diversidade e heterogeneidade são o reflexo concreto da sociedade. A habilidade de trabalhar estabelecendo os limites de cada um é o exercício a ser perseguido na prática educativa e de formação.
É certo que as condições objetivas para o exercício da docência em Educação física nas escolas do Distrito Federal estão aquém das ideais. A Educação pública e a escola sofrem com o descaso histórico do poder público, visíveis na desvalorização do profissional de educação, na precarização das relações de trabalho, nas carências em infra-estrutura, nos escassos materiais pedagógicos e determinantemente nas insuficientes ações de formação continuada. Cabe ressaltar que os professores de Educação Física da SEDF ficaram por quase 12 anos, isolados e abandonados quanto a esses quesitos. Somente para ilustrar, foram pouquíssimos cursos de formação na área ao longo desse tempo e ações e projetos totalmente distanciados da realidade e demanda escolar, alguns terceirizados. No ano de 2011, após esses 12 anos de dilapidação da educação pública no Distrito Federal (Roriz e Arruda), foram realizados, pela Diretoria de Desporto Escolar e Educação Física, um Seminário (SALUTE: Saúde e Lazer dos Trabalhadores em Educação), sete cursos em educação em saúde, um curso em xadrez escolar e um curso de gestores do Programa Ginástica nas Quadras e Centros de Iniciação Desportiva. Que pese esses esforços realizados, um déficit de tanto tempo não se resolve de um ano para outro. O que não se pode é culpabilizar o indivíduo para se dar alguma resposta sobre o ocorrido.
Acredito que o que aconteceu foi uma fatalidade. Uma fatalidade acontece quando não se pode prever o ocorrido ou que as variáveis estão “longe do alcance”. Quando acontecem situações deste tipo, sempre aparecem aqueles que defendem o atestado médico para a prática de Educação Física. Sou firmemente contra. A indústria do atestado médico não pode ressurgir das cinzas, pois além de não dar certo, contribui para que muitos arrumem uma justificativa para não apreender a disciplina. Alguém é proibido de fazer qualquer outra disciplina? A solução seria então impedir toda criança de ir para o recreio se não trouxer um laudo médico que ateste a sua “boa” capacidade para praticar algum exercício físico? Quantos jovens atletas morrem praticando diversas modalidades esportivas, mesmo com acompanhamento médico e infraestrutura de ponta? Por isso digo que foi fatalidade! Mas é claro que eu acredito na importância de se saber a realidade de cada sujeito.
O último ponto o qual acredito ser imperioso. O episódio ocorreu em uma aula de Educação Física Escolar e desta forma, não cabe a Conselho Profissional se “intrometer” neste âmbito, matéria da alçada do MEC e Conselho Nacional de Educação. O CREF/CONFEF NÂO PODE “cassar diplomas”! Não é de hoje que o Sistema CREF/CONFEF comete ingerências no âmbito escolar, de “olho” no ($) domínio deste campo que abriga milhares de trabalhadores em Educação Física, no entanto o CREF/CONFEF não possui respaldo legal para se envolver nesta questão devendo restringir-se ao seu campo de intervenção do qual, a Escola, não faz parte. Esse tipo de atuação deplorável e oportunista é inaceitável! Espero que o MEC, o CNE e a Coordenação de Educação Física e Desporto Escolar da SEDF não permitam intromissões “interesseiras” a esse respeito sobre o componente curricular Educação Física e dê o apoio necessário a família do estudante. E espero que o nosso sempre combativo SINPRO proporcione todo apoio à professora, para que não haja futuramente um sentimento de insegurança na prática docente em Educação Física.

Prof° Ms. Pedro Osmar Flores de Noronha Figueiredo (Tatu)
Professor da Secretaria de Educação do Distrito Federal
Secretário-Adjunto do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte
Membro do Fórum Popular e Permanente de Esporte e Lazer do DF



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