MEC amplia currículo alternativo para tirar ensino
médio público da crise
Reprovação é a mais alta desde 1999, segundo
divulgou Inep nesta semana. Projeto propõe adoção de disciplinas regionais e
aumento de carga horária.
Vanessa Fajardo*Do G1, em São Paulo
Neste ano, 1.660 escolas da rede pública aderiram
ao Programa Ensino Médio Inovador (Proemi), criado em 2009 peloMinistério da Educação com o objetivo
de reformular uma das mais problemáticas etapas do ensino. No total, segundo o
Ministério da Educação, o programa passou a atender 10% das escolas públicas
com ensino médio, o que representa uma adesão de 2.015 unidades nos 27 estados.
Em 2011, de acordo com dados do Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), a taxa de reprovação no ensino
médio foi de 13,1%, o maior índice desde 1999. Além disso, 9,6% dos estudantes
neste ciclo abandonaram a escola - no primeiro ano do ensino médio, a taxa de
abandono foi de 11,8%. As taxas de reprovação e abandono no ensino fundamental
foram de 9,6% e 2,8% no mesmo período, respectivamente.
O Proemi é uma tentativa do governo de desatar o
grande “nó” da educação pública do país. Os problemas encontrados desde as
primeiras séries do ensino fundamental vão se acumulando ao longo dos anos e
transformam o ensino médio em um grande 'gargalo'. Com um extenso conteúdo
espremido em três anos letivos, o ensino médio apresenta alto índice de evasão escolar,
alunos acima da idade adequada na série e baixos índices de proficiência em
matérias básicas como português e matemática (veja ao lado).
A reportagem do G1 visitou escolas
no Distrito Federal e em Pernambuco que aderiram ao ensino médio inovador, se
destacam por seus trabalhos e se tornaram uma exceção entre as escolas
públicas.
Sala de ginástica da
escola Setor Leste, melhor pública do DF no Enem (Foto: Jamila Tavares/G1)
Na cidade de Paudalho, na Zona da Mata de
Pernambuco, a Escola Estadual Monsenhor Landelino Barreto Linse, localizada na
Vila Asa Branca, transformou a realidade da comunidade. Os estudantes passaram
a ter aulas de práticas teatrais e sustentáveis; linguagem e cultura; educação
e saúde; atualidades e cultura digital; e comunicação e uso de mídias.
No Distrito Federal, a escola Setor Leste possui
ensino integral e oferece aulas para que os alunos tirem dúvidas no
contraturno. Os alunos têm aulas de circo, dança, ginástica olímpica, natação,
inglês, francês e espanhol. No programa desde 2010, a Setor obteve o melhor
desempenho no Enem de 2011 entre as escolas públicas do DF.
A escola rural Centro de Ensino Fundamental (CEF)
Agroubano do Caub I se focou em discussões sobre os 50 anos de Brasília e no
resgate da trajetória da Missão Cruls, responsável pela demarcação da área do
futuro Distrito Federal.
O Programa Ensino Médio Inovador prevê oferecer
disciplinas alternativas e aumentar a carga horária para tornar a escola mais
atraente. Para fazer parte do programa, as unidades têm de fazer uma proposta
de oferecer disciplinas que variam de acordo com as especificidades da região e
estejam dentro de quatro campos de conhecimento: trabalho, ciência, cultura e
tecnologia.
As matérias obrigatórias previstas pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação também devem estar no currículo. E é necessário
ampliar a jornada escolar para, no mínimo, 3.000 horas para os três anos do
ensino médio, ou seja, o mínimo de 5 horas de atividades diárias. Atualmente,
pelo currículo tradicional, a lei prevê 4 horas de aulas por dia, sendo pelo
menos 2.400 durante todo o ensino médio.
A previsão do ministério é atender mais 4 mil
escolas no próximo ano e alcançar 100% delas até 2015. A estimativa de
investimento para este ano é de R$ 140 milhões.
Apenas 11% aprendem
o esperado em matemática
no ensino médio (Foto: Reprodução)
no ensino médio (Foto: Reprodução)
Evasão e baixo rendimento
Problemas de evasão e baixo aproveitamento no aprendizado são detectados desde o início da educação básica, mas é no ensino médio que a situação atinge níveis alarmantes. A avalanche de conteúdo dos 3 anos do ensino médio perdeu o sentido e não se sabe se o objetivo do ensino médio é preparar para o vestibular ou para o mercado de trabalho. Sem a expectativa de cursar uma universidade e longe de encontrar especialização profissional na escola, muitos adolescentes abandonam os estudos para trabalhar e reforçar a renda familiar.
Segundo dados do Movimento Todos pela Educação
coletados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), só metade dos jovens brasileiros
conclui essa etapa do ensino na idade esperada (até os 19 anos). Desses, apenas
11% aprendem o considerado ideal em matemática.
Todos os anos, os rankings de desempenho dos
estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) revelam o fracasso do
ensino médio na rede pública. Em 2010, nenhuma escola estadual ou municipal
apareceu entre as 100 primeiras com as melhores notas. As 13 escolas públicas
que aparecem no universo das 100 melhores são colégios de aplicação de
universidades, militares, escolas federais e técnicas.
Marinalva de França
e Deize Lopes, alunas da
Escola Monsenhor Landelino Barreto Linse,
em Paudalho (PE) (Foto: Luna Markman/G1)
Escola Monsenhor Landelino Barreto Linse,
em Paudalho (PE) (Foto: Luna Markman/G1)
Mudanças
Celso João Ferretti, doutor em história e filosofia da educação, do Centro de Estudos de Educação e Sociedade, diz que é favorável à proposta, mas colocá-la em prática não é simples porque não se trata apenas de uma reforma curricular. “É uma mudança da ‘forma de ser’ da escola. Tem de haver uma mudança na formação dos professores, criar possibilidade de mantê-lo na mesma escola, condições que não se encontram na rede pública. Por isso é uma proposta a ser realizada”, afirma.
Celso João Ferretti, doutor em história e filosofia da educação, do Centro de Estudos de Educação e Sociedade, diz que é favorável à proposta, mas colocá-la em prática não é simples porque não se trata apenas de uma reforma curricular. “É uma mudança da ‘forma de ser’ da escola. Tem de haver uma mudança na formação dos professores, criar possibilidade de mantê-lo na mesma escola, condições que não se encontram na rede pública. Por isso é uma proposta a ser realizada”, afirma.
Para Ferretti, o projeto é interessante pois leva o
estudante a ter uma visão mais clara da vida que tem. “A proposta é que os
diferentes campos de saberes se articulem para desenvolver uma visão a respeito
do mundo, da política, da tecnologia e da economia, entre outros.”
Priscila Cruz, diretora executiva do Todos pela
Educação, concorda que a mudança vai além do currículo escolar. “É importante
resolver o nó do ensino médio. Os resultados de proficiência são muito pequenos
e há dez anos não há melhora. Se não houver outro modelo, não será possível
aproveitar os avanços dos ciclos anteriores. O ensino médio empaca qualquer
outro avanço.”
Priscila aprova o modelo do ensino médio inovador,
pois sinaliza para maior flexibilidade, sai do ‘modelo enciclopédico’ com 14
disciplinas obrigatórias que não aprofundam em nenhum tema, mas diz que é
necessário ampliá-lo.
“Não dá para fazer mudança sem passar por questões
complicadas. Tem de mudar estruturamente, fazer o aluno passar mais tempo aluno
na escola, pensar na formação do professor, no currículo. Assim como uma
orquestra onde todos os instrumentos tocam bem e harmonicamente, um fortalece e
outro, senão a música fica ruim", diz Priscila.
* Colaboraram Jamila Tavares, do G1 DF, e Luna
Markman, do G1 PE
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