sexta-feira, 6 de junho de 2014

Desafios, (críticas) oportunidades e legados da Copa 2014 são debatidos no Cenas do...

Assista o video do debate realizado ontem na TV NBR (e não TV Brasil) sobre a Copa.

CENAS DO BRASIL - A Copa do Mundo é o tema do Cenas do Brasil desta semana. Além dos desafios do futebol brasileiro, o programa debate a importância do evento para o país. Os convidados: Toninho Nascimento, secretário Nacional de Futebol do Ministério do Esporte; e Pedro Osmar Figueiredo, secretário Adjunto Distrital do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, debatem também os investimentos realizados, as oportunidades oferecidas e a infraestrutura deixada como legado da Copa 2014 para a população brasileira.
Faltou falarem que eu ia falar sobre a pertinência da crítica sobre a realização e organização da Copa 2014 no Brasil. Que resultaram nas manifestações em torno deste acontecimento social.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Vai ou não vai ter Copa?



Eu sou contra a CBF e FIFA!
Contra a privatização dos Estadios!
Contra a elitizacao dos Estadios!
Contra a criminalização das manifestações e dos movimentos sociais!
Contra a violencia policial!
Contra a remocao de moradias e a especulação imobiliária desses locais!
Contra o incentivo ao turismo sexual!
Contra a Lei Geral da copa ( com beneficios extremados pra a Fifa e seus parceiros)!
Contra a higienizacao ( com a retirada dos camelos/trabalhadores das areas alugadas pra FIFA)!
Os dados tem mostrado que a Copa é um grande negocio pra FIFa, pra Midia e para as grandes empreiteiras!
Que foi um erro estrategico do governo trazer para cá a Copa considerando as aliancas que teriam que fazer!
E que o trabalhador pobre além de nao se beneficiar dos supostos beneficios da Copa sao os mais atingidos nas acoes realizadas!
Sou a favor do futebol, como prática de encontro, como vivencia cultural, como patrimonio cultural brasileiro!
Sou a favor das obras de mobilidade quando estas atendem os interesses dos trabalhadores e não apenas fazem o corredor aeroporto estadio!
Sou a favor da modernização dos aeroportos quando estes são pensados na ampliacao e democratizacao do lazer/ turismo/negocio e nao na volta da elitizacao da mobilidade aerea!
Sou a favor do esporte como direito!!

Eu estarei daqui a pouco na TV Brasil: Debate sobre a copa


No Cenas do Brasil desta quinta-feira, 5 de junho, vamos falar sobre a Copa do Mundo - a importância do evento para o país, os gastos, o futebol brasileiro e a infraestrutura dos estádios. Vamos mostrar os vídeos "A Copa vai ser boa para o Brasil?" e "A Copa das Copas". Esse programa foi gravado.
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>      Participam do debate, Toninho Nascimento, Secretário Nacional de Futebol do Ministério do Esporte; e Pedro Osmar Figueiredo, Secretário Adjunto Distrital do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte.
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>     "Cenas do Brasil" é transmitido pela NBR para todo o Brasil, às quintas-feiras, das 20h30 às 21h30. As reprises são veiculadas na própria quinta, às 22h30; sexta-feira, às 13h30 e 21h30; segunda, 1h e 22h30; sábado, 2h; e domingo 12h; além de outros horários na semana seguinte. O programa fica disponível no youtube: www.youtube.com/tvnbr
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>      Para obter informação sobre como sintonizar a TV NBR em sua cidade, acesse http://www.ebcservicos.ebc.com.br/veiculos/nbr/como-assistir. Para assistir ao vivo pela internet,acessar: www.planalto.gov.br e clicar em NBR ao vivo.
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>      O programa "Cenas do Brasil" é uma realização da Diretoria de Negócios e Serviços da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e coloca em pauta temas de relevância nacional, com avaliação das políticas públicas implementadas em cada área do Governo.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

DOSSIÊ VÔLEI: O JOGO SUJO DA MÁFIA ESPORTIVA

DOSSIÊ VÔLEI: Processos mostram privilégios em negócios com empresas de ex-dirigentes da CBV

Por Lúcio de Castro, para o ESPN.com.br

Os negócios da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) estão sob poderosa lente de aumento.
Relações estreitas e negócios de alto volume com empresas abertas poucos meses antes da parceria. Os acionistas dessas empresas: ex-dirigentes da CBV. O ônus das operações para a instituição e o bônus para tais firmas. Contradições. Acordos judiciais de frágil sustentação envolvendo essas empresas. No coração de tudo isso, um farto duto de dinheiro público a jorrar com "a ausência de instrumentos efetivos de controle e acompanhamento", como afirma um antigo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) ao qual a reportagem teve acesso. O balanço financeiro de 2011/12 da CBV indica R$ 24 milhões a receber do Banco do Brasil e mais de R$ 16 milhões de reais do Governo Federal.
Por enquanto, só existe uma certeza: o fio do novelo dos negócios do vôlei brasileiro começa a ser puxado. Os primeiros movimentos revelam ingredientes de um folhetim daqueles em que ninguém pode dizer ao certo onde vai chegar.
A observação de um repetido modo de operar através de empresas cujos sócios são ex-dirigentes da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) gerou uma investigação que corre em sigilo. A existência de dinheiro de origem pública nas movimentações foi o marco inicial da apuração em curso e aumenta o teor explosivo dos próximos passos a serem investigados.
O ponto de partida das investigações foi a existência de um mesmo modus operandi, constatado em ações trabalhistas que correm na justiça do Rio de Janeiro.
Chamou atenção o fato das empresas apontadas nos processos pertencerem a ex-dirigentes da CBV.
Como no caso da SMP Consultoria Esportiva e Representações LTDA.
Em sua constituição societária, de acordo com o documento obtido por esta reportagem na Junta Comercial do Rio, a SMP, aberta em agosto de 2001, tem 99% das cotas nas mãos de Marcos Antônio Pina Barbosa, superintendente da CBV nos anos 90 e de volta em 2013, após a saída do presidente da entidade, Ary Graça Filho, para assumir a presidência da Federação Internacional de Vôlei (FIVB).
Arte ESPN
Dossiê Vôlei
Dossiê Vôlei: Documento mostra nome de Marcos Pina e sua mulher como sócios da empresa SMP
Questionada sobre tal relação pela reportagem, a CBV, através de sua assessoria de imprensa, respondeu que "Marcos Pina foi Superintendente Geral da CBV de 1997 a 1999, quando solicitou afastamento por iniciativa própria. Se manteve sem qualquer vínculo empregatício com a entidade até setembro de 2013, quando foi recontratado como Superintendente Geral pela nova gestão".
No entanto, de acordo com o site da própria CBV, em comunicado de 18 de setembro de 2013, Marcos Pina foi superintendente da confederação entre 1997 e 2000.
Sem informar a criação da empresa, o site da entidade informa que "entre o período de 2001 e 2006 foi responsável pela organização dos Mundiais de vôlei de praia e indoor".
Ainda de acordo com o site, de 2007 a 2011 "criou o site VôleiBrasil e hoje é Grande Benemérito e Conselheiro da CBV".
Em setembro de 2013, o site informa que Marcos Pina assumiu o cargo de superintendente geral da CBV, "com status de CEO". Na Receita Federal, o CNPJ da empresa SMP Consultoria Esportiva e Representações LTDA. segue ativo.
Arte ESPN
Dossiê Vôlei
Dossiê Vôlei: site da CBV anuncia que Marcos Pina assumiu o cargo de Superintendente Geral em 18 de setembro de 2013
Em algumas dessas ações judiciais que chamaram atenção, como em uma de abril de 2010, o reclamante litiga contra a CBV e contra a SMP, alegando que, apesar de contratado da SMP, sempre tinha sido empregado da CBV.
Chamou a atenção que, embora em uma ação como essa, CBV e SMP tivessem aparentes interesses conflitantes, antes mesmo da ação ser julgada, ainda na fase de instrução, a CBV fez um acordo com o reclamante. A SMP, de Marcos Pina, não teve ônus no acordo, ficando a CBV responsável pelo pagamento de R$ 144.000,00. A entidade máxima do vôlei pagou ainda R$ 79.061,14 entre imposto de renda, INSS e custa da ação, num total de R$ 223.061,14.
Questionada pela reportagem sobre a razão para tal acordo na Justiça, deixando a SMP sem qualquer ônus, a CBV respondeu que " a SMP foi excluída da posição de ré antes da finalização do processo, por decisão judicial, restando apenas a CBV como ré".
Não é fato que a SMP tenha sido excluída por decisão judicial. A resposta não corresponde ao correto sobre o ocorrido, já que a conciliação acontece na Justiça entre as partes antes da decisão judicial e naturalmente só ocorre se todas as partes aceitarem, aí sim se transformando em decisão judicial.
Arte ESPN
Dossiê Vôlei
Dossiê Vôlei: Documento mostra acordo judicial feito pela Confederação Brasileira de Vôlei na Justiça do Trabalho
Os aparentes interesses conflitantes entre CBV e SMP na ação também não impediram de ambas estarem representadas pelo mesmo escritório de advocacia.
Nessa mesma ação de abril de 2010, chamou também atenção na investigação em curso um outro nome. Fábio André Dias Azevedo consta como o representante da CBV na disputa judicial.
Poucos meses depois, por apuração da reportagem, Fábio André Dias Azevedo já é encontrado como um dos acionistas da S4G, aberta no dia 10 setembro de 2010.
No balanço financeiro de 2011/12, a entidade informa que "em dezembro de 2010 contratou a empresa S4G por notória especialização para prestação dos serviços de planejamento, produção e comercialização dos eventos de voleibol de quadra e praia".
A "notória especialização da S4G", constante na justificativa da CBV para a contratação esbarra nas datas, já que foi aberta em setembro de 2010, como consta na Receita Federal, e contratada em dezembro de 2010.
Arte ESPN
Dossiê Vôlei
Dossiê Vôlei: Documento mostra anúncio da contratação da S4G pela Confederação Brasileira de Vôlei
Questionada pela reportagem sobre tal relação comercial, a CBV respondeu que "A S4G é uma empresa reconhecida no mercado. Já trabalhou para outras modalidades e eventos esportivos, entre eles, os Jogos Mundiais Militares, quando foi vencedora de licitação, tanto para o vôlei como para outros esportes". A reportagem tentou contato com o representante da S4G nos endereços conhecidos sem obter sucesso.
Além do CNPJ da citada empresa aberta em setembro de 2010 como S4G Gestão de Eventos, utilizando o mesmo endereço, a empresa diversificou seus CNPJs em 2011. No mesmo dia 12 de abril de 2011, foram abertas com dois CNPJs distintos a S4G Gestão de Negócios e ainda um outro para a S4G Planejamento e Marketing. Os três CNPJs da S4G tem como sede a cidade de Saquarema.
No mesmo prédio onde constam os três CNPJs da S4G está ativo o CNPJ da AGF Assessoria e Participações, de propriedade de Ary Graça, presidente da CBV até 2012, quando saiu para assumir a presidência da Federação Internacional de Vôlei. O centro de treinamento da CBV também fica em Saquarema.
O estabelecimento de vultosos negócios por parte de entidades com empresas recém abertas, de propriedade de pessoas relacionadas com essas instituições, não compõe ilegalidades, embora chamem atenção. Tais histórias não chegam a ser novidade no esporte brasileiro.
A investigação faz lembrar fato semelhante ocorrido em outra entidade esportiva que gerou um escândalo com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Em 19 de novembro de 2008, a seleção brasileira de futebol jogou contra Portugal, em Brasília, em amistoso contratado pela Ailanto Marketing, constituída cinco meses antes, em 29 de maio de 2008, o que chamou atenção.
O fio do novelo. Foram essas investigações posteriores que comprovaram ligações de Ricardo Teixeira com a Ailanto. E por fim culminaram com a queda de Ricardo Teixeira.
Fonte: http://espn.uol.com.br/noticia/391752_dossie-volei-processos-mostram-privilegios-em-negocios-com-empresas-de-ex-dirigentes-da-cbv


terça-feira, 13 de maio de 2014

Essa Confraria Masculina chamada Futebol: "Se a bandeirinha é bonitinha, que vá posar na Playboy"

Crônica / Matheus Pichonelli

"Se a bandeirinha é bonitinha, que vá posar na Playboy"

A agressão verbal contra a auxiliar Fernanda Uliana prova que o futebol é o penúltimo reduto da misoginia. O último é o jornalismo boleiro.
por Matheus Pichonelli — 
bandeirinha.jpg"Reportagem" do jornal Extra sobre a bandeirinha Fernanda Uliana
O futebol é o penúltimo reduto da misoginia. O último é o jornalismo boleiro. Misoginia, para quem não sabe, é a palavra designada pelos gregos para classificar o “horror e a aversão” a tudo o que é ligado ao feminino e às mulheres.
Essa aversão ganhou ares de alarme após a vitória do Atlético Mineiro sobre o Cruzeiro no domingo 11. Desde então, nenhum assunto foi mais comentado no mundo futebolístico do que a existência da bandeirinha Fernanda Colombo Uliana. Nem mesmo os erros cometidos por ela durante a partida e referendados por um homem, o árbitro Heber Roberto Lopes, entre eles um pênalti não marcado e um impedimento inexistente para a equipe azul celeste. O assunto era outro: a sua simples presença da bandeirinha em um local sagrado para os homens.
Basta uma simples busca no Google (“bandeirinha gata é clicada em pose indiscreta”, “conheça a linda e polêmica bandeirinha”) e as deferências dos ogros do esporte sobre o corpo estranho em um grutão construído por homens, entre homens e para os homens. “Se ela é bonitinha, que vá posar na Playboy. No futebol tem que ser boa de serviço”, chegou a dizer o diretor de futebol do Cruzeiro, Alexandre Mattos, após o clássico mineiro.
Em sua demonstração pública de misoginia, Mattos se esqueceu de lembrar que os erros da bandeirinha foram referendados pelo chefe da arbitragem. Um homem, portanto. Mas, ao fim do jogo, nem Mattos nem ninguém mandou que Heber Roberto Lopes fosse posar na Playboy. Ou que fosse consertar motor de carro. Ou plantar
laranja. Faz sentido: quando o árbitro erra, ele é poupado até no xingamento. A ofensa é direcionada à aleivosia da sua mãe ou à fidelidade da sua esposa. Nunca a ele (a não ser, claro, que seja negro).
Pela repercussão, os erros da bandeirinha não colocaram a arbitragem em xeque, mas sim a capacidade feminina de se instalar em um campo de domínio masculino. Uma coisa é mulher jogar futebol. Quando isso acontece, ninguém se comove: os estádios não lotam, a imprensa esportiva dá de ombros, os patrocinadores fazem pouco caso. Mas uma mulher arbitrando no quintal masculino é mais que uma concessão: é uma ofensa. Porque tudo no mundo futebolístico é masculino. Nesse domínio, a regra é clara: a única seleção capacitada a representar o País é composta por 11 jogadores homens, um treinador homem, auxiliares técnicos homens e dirigentes homens. Se tiverem sorte, as mulheres poderão atuar como nutricionistas ou psicólogas.
Na minha vida profissional, tive pelo menos dez mulheres como superiores diretas. Se para qualquer uma eu respondesse, a cada decisão contrariada, que ela deveria posar na Playboy, ganharia uma bifa na cara, uma carta de demissão e um processo na Justiça. No futebol a relação inexiste porque o esporte quase nunca é pensado para outro público se não o tiozão sentado no sofá, ou na arquibancada, com uma lata de cerveja na mão. Porque é construído e transmitido por tiozões. Basta notar os comentários ao fim dos jogos. Basta reparar nas piadas dos comentaristas ao lado das apresentadoras-alvo-de-piadas. Basta ver o esforço das câmeras para pinçar um decote no meio da torcida (se houver um celular entre o decote, melhor). E basta ver ao fim do jogo as galerias de “belas da torcida”. Ou a galeria de poses insinuantes à beira do campo da nova “musa” do esporte.
Em conversas e rodas informais, costumo dizer que o futebol é um microcosmos da vida comum, e não apenas por assimilar em campo as práticas que consideramos moralmente valiosas, como a generosidade do passe, a doação pelo companheiro contundido, o fôlego extra por um objetivo, a fidelidade dos propósitos e a frieza na hora de tomar uma decisão (o pênalti, nesse sentido, é a situação-limite que todos os cineastas buscam levar à tela). Mas é também um microcosmo do nosso primitivismo. O desembaraço do achincalhe sobre a bandeirinha Fernanda Uliana é o mesmo que permite agredir mulheres nas ruas e culpar a sua saia. Segundo essa concepção, Uliana e as mulheres não entram em campo para trabalhar, mas para aparecer. E as agressões são apenas as reações naturalizadas de uma mesma ousadia – e não de uma incapacidade ancestral de conter o verbo ou a agressão.
Ao fundo da fala do dirigente do Cruzeiro é possível visualizar uma velha cortina: “quem mandou provocar”, “se estivesse em casa não teria acontecido nada disso”. “Se errou, é porque é mulher”. “Se acertou, é apesar de ser mulher”. A galeria de poses sensuais de Fernanda em seu ambiente de trabalho (só para lembrar: os juízes também usam shorts e deixam parte das coxas à mostra) é o combustível aditivado para a construção desse discurso.
E é com base nesse discurso que, em nome honra (hombridade?) da sua torcida e de seu país, o futebol trancafia durante dias os marmanjos para se preparar para as partidas decisivas. Na concentração é proibido chegar perto de mulher. E é proibido receber ou promover visitas íntimas. Maldita maçã envenenada esta de Eva. Não só expulsou os donos das costelas do paraíso como quer envenenar o último bastião de sua pureza, essa grande confraria masculina chamada futebol.

Lançamento do Livro:

Copa do Mundo na África do Sul – Um legado para quem?


Organizado por Eddie Cottle

Traduzido por Lara Freitas

ISBN: 978-85-7474-752-1 
Páginas: 408 ilustradas 
Peso: 750g 
Ano: 2014

Foto da capa: Estádio do Soccer City, na abertura da Copa 2010 na África do Sul

Capa: Rodrigo Poeta


Uma lição vinda da África do Sul:

Os cartéis da construção estão aumentando significativamente os custos de infraestrutura da Copa do Mundo FIFA 2014 no Brasil? 
Eddie Cottle, Paulo Capela, André Furlan Meirinho

Introdução 
A luta e a organização dos trabalhadores da construção civil e madeira da África do Sul para reivindicar melhores condições de trabalho antes e depois da realização da Copa do Mundo de Futebol de 2010 naquele país tornaram-se referência para as jornadas de lutas e organização dos trabalhadores da construção civil de todo o mundo. 
A exitosa organização dos sindicatos possibilitou inúmeros ganhos aos trabalhadores e também o desenvolvimento de uma metodologia de análise das obras das arenas “padrão” FIFA, capaz de desvelar os valores dos superfaturamentos das indústrias da construção em conluio com empreiteiras. 
Assim, em abril de 2013, os diretores do Instituto de Estudos Latino- Americanos da Universidade Federal de Santa Catarina (IELA-UFSC), têm um primeiro contato com o pesquisador sul-africano Eddie Cottle, convidado para uma das conferências da IX edição das Jornadas Bolivarianas, principal atividade científica anual do Instituto. Eddie é convidado por seu protagonismo durante todo o processo de luta dos trabalhadores sul-africanos que laboraram nas obras da Copa do Mundo FIFA de Futebol de 2010-África do Sul e também por ser organizador, autor e editor do original em língua inglesa: South Africa’s World Cup: a legacy for whom?. Em sua obra, juntamente com outros 12 importantes pesquisadores sul-africanos, ele põe luz sobre inúmeros fatos envolvendo a realização da Copa FIFA de Futebol de 2010. 
Em julho de 2013, Eddie Cottle retorna ao IELA para realizar uma investigação conjunta com pesquisadores e acadêmicos do Instituto sobre o custo das arenas de futebol para a Copa FIFA de Futebol de 2014 no Brasil. Utilizando-se da metodologia empregada por ele na África do Sul, são encontrados números importantes sobre os valores das obras das arenas construídas e reformadas no Brasil. São números que ainda carecem de mais aprofundamentos, mas que já permitem visualizar muitos dos valores que estão sendo gastos a mais para a realização da Copa do Mundo de futebol 2014 no Brasil. 
O relatório preliminar do IELA propunha-se tornar público os primeiros números da operação dos cartéis da construção durante a execução de obras da Copa do Mundo de Futebol FIFA e a primeira atividade da parceria que passaremos a estabelecer com os pesquisadores do continente africano no sentido de potencializar nossas ações de esclarecimento e oferecimento de informações científicas para a ação dos trabalhadores numa perspectiva desde o sul, fugindo assim do determinismo científico eurocêntrico e estadunidense que tem enfraquecido as ações dos pesquisadores universitários brasileiros em vincularem-se organicamente às lutas populares e no mesmo sentido produzido um academicismo estéril às causas nacionais.
Já em 2008 o relatório do Comitê de Concorrência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) do setor de construção descobriu que, “infelizmente, a indústria da construção foi vítima da atividade de cartel, conforme foi exposto em matérias amplamente divulgadas em todo o mundo”. Na mesa-redonda do OCDE, 19 países da Europa, Ásia, América do Norte, e principalmente, da África do Sul denunciaram amplamente a atividade de cartel. Foi descoberto cartel na indústria do cimento na Turquia e na Alemanha, incluindo fixação de preços e divisão de mercado. 
Na Holanda, as empresas de construção foram consideradas culpadas por manter contas secretas nas quais mantinham valores de fraudes cometidas em 8,8% de todas as obras públicas que executaram. Valores, portanto, produto de conluio. No Japão e no Reino Unido, grandes empresas envolveram-se na manipulação das licitações para construção de pontes, estradas, escolas, hospitais e conjuntos habitacionais, para citar apenas alguns exemplos. 
Nesse encontro do OCDE, a África do Sul apresentou seu relatório sobre os custos excessivos relacionados aos estádios da Copa do Mundo FIFA 2010 que, na época, estavam sob suspeitas de ter licitações fraudulentas. 
Através de práticas de conluio, fraude nas licitações e superfaturamento, as empresas de construção de obras para a Copa FIFA vêm obtendo em todo mundo enormes ganhos financeiros à custa dos trabalhadores e dos contribuintes dos países-sede. O que tem ocorrido com as irregularidades do setor de construção é preocupante pelo fato de que esse setor não é somente vital para todos os aspectos da atividade econômica, mas também porque oferece a infraestrutura necessária para suprir as necessidades básicas das pessoas tais como habitação, escolas, universidades, hospitais e uma série de outras edificações do governo e outras instalações públicas. O setor de construção também constrói estradas, ferrovias, portos, sistemas de esgoto etc. 
Implicitamente, isso significa que as metas de desenvolvimento propostas pelos governos nacionais que sediam a Copa FIFA de Futebol são frustradas em parte pela transferência maciça de riqueza desses Estados para empresas privadas, em detrimento da criação de emprego e redistribuição de renda para a população, inibindo assim os ganhos econômicos a que se destina. É neste contexto que se insurge o descontentamento nacional no Brasil, levando milhares de pessoas, nas principais cidades, a manifestarem sua indignação de forma legítima contra o aumento dos custos de transporte, a má qualidade dos serviços de saúde e de educação, incluindo os custos crescentes da realização da Copa do Mundo da FIFA. 
São as práticas de conluio de empresas de construção que produzem os custos exorbitantes dos estádios da Copa do Mundo e dos projetos de infraestrutura. Na África do Sul, que sediou a Copa do Mundo FIFA 2010, somente o custo dos estádios aumentou em 1.008%. No Brasil, o aumento dos custos dos estádios da Copa do Mundo já está em 327%, segundo as estimativas de 2013, e aumentarão rapidamente conforme os estádios sejam concluídos. No ritmo atual de aumento dos custos, é provável que o Brasil realize a Copa do Mundo FIFA mais cara da história das Copas do Mundo. 
Portanto, esta análise desafia a população e o governo brasileiro a seguirem, imediatamente, o exemplo dado pela Comissão de Concorrência da África do Sul, que investigou as operações do cartel de construção e a forma como atuaram na construção das obras da Copa FIFA, levando finalmente as empresas culpadas a um tribunal que multou as empresas de construção por práticas de concorrência desleais, estando as empresas na eminência de também serem consideradas empresas não cooperativas.

Lições dadas pela África do Sul

O aumento de custos da Copa do Mundo FIFA 2010 na África do Sul foi significativo e inicialmente atribuído à vulnerabilidade dos países por conta da crise econômica mundial 2008-2009. O ex-ministro da Fazenda sul-africano, Trevor Manuel, afirmou, em outubro de 2008, que as obras da construção da Copa do Mundo seriam afetadas porque “os custos de construção são uma grande ameaça para o que queremos fazer”. No entanto, ele não observou que em outubro de 2007 a Comissão de Concorrência da África do Sul montou uma equipe para rever os materiais de construção e o setor de serviços. 
A estimativa do custo inicial foi calculada em 2,3 bilhões de rands (moeda sul-africana) – o equivalente a 519 milhões, em reais – e seria pago pelo governo sul-africano, em grande parte para financiar os estádios e a infra-estrutura. Entretanto, o custo total estimado de 2010 (e é provável que seja ainda muito maior) para o governo da África do Sul era de 39,3 bilhões de rands (8,9 bilhões, em reais) – um aumento absurdo de 1.709% sobre a estimativa inicial. Os custos dos estádios aumentaram da estimativa inicial de 1,5 bilhões de rands (338 milhões, em reais) para a última estimativa de custos em mais de 17,4 milhões de rands (3,9 bilhões, em reais), representando um aumento de 1.008%. 
Cinco grandes empresas de construção civil na África do Sul: Aveng, Murray & Roberts, Group Five, Wilson Bayly Holmes-Ovcon (WBHO) e Basil Read foram as principais empreiteiras na construção dos estádios para a Copa do Mundo FIFA 2010 e vários projetos de infraestrutura nos quais elas obtiveram lucros substanciais. Em 2007, todas estavam sob investigação da Comissão de Concorrência da África do Sul por suspeita de conluio e práticas anticompetitivas em relação a esses projetos. 
Infelizmente, a comissão não investigou as ações de empresas internacionais tais como a alemã HBM Stadien-und Sportstättenbau GmbH, empresa especializada na construção de estádios, a GMP Architekten and Hi-ghtex engineers; a italiana Cimolai; a francesa Bouygues e a holandesa BAM International, envolvidas na construção dos estádios e que tiveram grandes aumentos dos custos de construção. 
Em 17 de julho de 2013, no tribunal da Comissão da Concorrência da África do Sul foram estimados de forma moderada em cerca de 4,7 bilhões Derands(1 bilhão, em reais) os “lucros indevidos” obtidos por empresas de construção nos preparativos para a Copa do Mundo 2010 e em outros projetos. Elas foram multadas, consequentemente, em um total de 1,5 bilhões de rands(338 milhões, em reais). As empresas de construção que não concordaram com a resolução, tais como a Group 5, a Construction ID e a Power Construction, agora enfrentam um possível processo.

O setor da construção brasileiro

De acordo com o Portal 2014 brasileiro (www.portal2014.org.br/andamento-obras) as empresas de construção contratadas para a Copa do Mundo e infraestrutura relacionada são: Odebrecht, Andrade Gutierrez, Galvão Engenharia, OAS Empreendimentos, Mendes Júnior, Via Engineering, Andrade Mendonça, Construcap, Egesa, Hap e Engevix. As duas maiores empresas de construção brasileiras envolvidas na Copa do Mundo são a Andrade Gutierrez e a Odebrecht. 
Conforme a Copa do Mundo e as Olimpíadas se aproximam, o setor de construção brasileiro está prestes a sair de sua inesperada queda de faturamento, o que pode ser vista pelo seu fraco desempenho, atingindo um crescimento de apenas 4,2% em 2011 e de 2,2% em 2012. Esse resultado está relacionado ao fato de que em maio de 2012 somente 25% dos projetos de transporte para a Copa haviam completado o processo de licitação; e no final do mesmo mês, 41% das obras para a Copa do Mundo ainda não haviam sido iniciadas. O setor de construção tem que concluir a construção de 13 aeroportos, 7 portos e 37 projetos de transporte, e ainda construir ou reformar 12 estádios para a Copa do Mundo de 2014. Este setor emprega 2,5 milhões de trabalhadores formais e as estimativas mostram que existem 1,5 milhões de trabalhadores informais. O atraso contribui para o aumento da taxa de desemprego no Brasil que foi de 5,60% em fevereiro de 2013. Muitas das empresas envolvidas nos gastos com a infraestrutura da Copa do Mundo no Brasil são sociedades fechadas e, portanto, as informações financeiras das empresas não estão prontamente disponíveis. No momento da composição deste texto a maioria das empresas ainda não havia divulgado seus Relatórios Anuais de 2013, que poderiam oferecer uma perspectiva diferente ao que está sendo apresentado aqui, pois a posição financeira provavelmente melhorou conforme indicado anteriormente. 
O que ficou claro é que parece que o setor está passando por flutuações drásticas em seus lucros líquidos anuais. A Engevix, por exemplo, divulgou -85% em 2010, porém apontou um aumento de 256% em 2011. Empresas tais como a OAS Empreendimentos, que tinha um lucro líquido de 2.244% em 2010, teve uma diminuição de 360% em 2011. A Andrade Gutierrez divulgou um aumento de lucro líquido de 23% em 2010 e de 28% em 2011. Já a Odebrecht divulgou um aumento de 148% em seu lucro líquido em 2010, o maior lucro de sua história. As empresas não envolvidas nos projetos de construção da Copa do Mundo são a Santa Barbara Consortium Construction, da Arena Pantanal, que foi à falência, e a Delta Construction, que participou da construção do estádio do Maracanã, porém um Comitê do Congresso descobriu que ela estava envolvida em subornos feitos a políticos e outros agentes públicos.

Gastos excessivos dos estádios brasileiros

Construtoras brasileiras e estrangeiras, tais como o escritório de arquitetura alemão GMP, são os principais beneficiários dos gastos com a Copa do Mundo FIFA 2014 e com a infraestrutura relacionada à Copa, que está atualmente calculada em U$ 18 bilhões, sendo 78% dos gastos totais provenientes de financiamento público. 
De acordo com o ministro dos Esportes do Brasil, o impacto geral econômico superará U$ 100 bilhões, criando 332.000 empregos permanentes (2009-2014) e 381.000 empregos temporários em 2014. 
O fato de que até maio de 2012 apenas 41% das obras para a Copa do Mundo ainda não tivessem começado levou o Governo Federal a mudar seus procedimentos para a aprovação de projetos com um “estatuto de excepcionalidade”, criado para aumentar a velocidade de aprovações para projetos de infraestrutura da Copa do Mundo 2014. Consequentemente, as empresas de construção usarão de forma oportuna essa situação a seu favor para fixar os custos das licitações oficiais acima do seu valor, resultando em gastos excessivos que terão de ser pagos pelo governo brasileiro com fundos públicos. A Andrade Gutierrez está envolvida na construção do Estádio Nacional Mané Garrincha (Brasília), da Arena Amazonas (Manaus), do Estádio Beira--Rio (Porto Alegre) e do Estádio do Maracanã (Rio de Janeiro). A Odebrecht na construção do Estádio do Maracanã (Rio de Janeiro), do Estádio da Fonte Nova (Salvador), da Arena Pernambuco (Recife) e do Itaquerão (São Paulo). As duas empresas são responsáveis por 7 dos 12 estádios da Copa do Mundo. Embora tenhamos usado fontes confiáveis para obter os custos dos estádios, os números podem variar ou serem inconsistentes. A fonte mais confiável para as estimativas originais de custo de cada um dos estádios está no Brazil 2014 Bid Book. Porém, o Brazil 2014 FIFA World Cup Bid Book não é divulgado publicamente (assim como todos os bid books), não sendo então possível consultar os custos originais para cada estádio. No entanto, é razoável supor que já que o Brazil Bid Book foi enviado à FIFA até 31 de julho de 2007 e que a Equipe de Inspeção da FIFA realizou a visita de inspeção em 23 de agosto de 2007, o valor constante neste relatório de U$ 1,1 bilhões para todos os estádios reflete os números originais do Bid Book.

Rumo a uma investigação sobre cartel no setor de construção

Em agosto de 2013, o Congresso Brasileiro propôs a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os gastos excessivos com os estádios e as alegações de corrupção. O pedido de investigação veio do “senador Álvaro Dias, do principal partido de oposição, o PSDB, que inicialmente solicitou a investigação” como resposta às exigências dos manifestantes brasileiros nas ruas. Acreditamos que há motivos suficientes para o governo brasileiro abrir uma investigação completa sobre as operações de um cartel de construção; o Relatório do Comitê de Concorrência da OCDE, a evidência irrefutável do Relatório da Comissão de Concorrência da África do Sul, especialmente em relação à Copa do Mundo FIFA 2010, e os aumentos abusivos de custos dos estádios do Brasil quando comparados com o Relatório da Equipe de Inspeção da FIFA de 2007. Ainda mais uma motivação para a necessidade de tal investigação é a recente decisão por parte do estado de São Paulo de “abrir um processo contra a Siemens AG (SI) para tentar recuperar o dinheiro que a empresa supostamente superfaturou do Estado pelos trens vendidos por um consórcio para a cidade e redes de transporte regionais”. Neste último caso, deverão demonstrar a necessidade de garantir que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), envolvido na investigação da Siemens, estenda sua investigação ao setor de construção. Tal investigação sobre os negócios do cartel de construção não deve se limitar às empresas brasileiras, mas deve, também, se estender às empresas internacionais envolvidas em atividades de construção civil relacionadas. 
Por fim, é necessário que o governo brasileiro responda aos apelos da sociedade civil por mais transparência na prestação de contas e nos assuntos relacionados à Copa do Mundo FIFA 2014 e que divulgue publicamente o Bid Book brasileiro oficial.

Sumário

Introdução 
Eddie Cottle 
1 FIFA e o complexo desportivo de acumulação 
Dale T. McKinley 
2 Promessas econômicas e armadilhas da Copa do Mundo da África do Sul 
Patrick Bond e Eddie Cottle 
3 O caneco deles transbordou – Empresas de construção e a Copa do Mundo da FIFA de 2010 
Michelle Taal 
4 Chutando no próprio gol? – A greve dos operários da Copa do Mundo de 2010 
Eddie Cottle 
5 O legado dos sindicatos da Copa do Mundo 2010 – a solidariedade internacional revitalizada 
Vasco Pedrina e Joachim Merz 
6 Comércio informal e a batalha pelos negócios 
Pat Horn 
7 Mentiras, deturpação e expectativas não alcançadas – Exploração sexual e a Copa do Mundo de Futebol de 2010 
Vivienne Mentor-Lalu 
8 O greenwashing da FIFA – A Copa do Mundo e o Aquecimento Global 
Trsiten Taylor 
9 Soccer City – Quem bebeu toda a cerveja da cabaça? 
Mondli Hlatshwayo 
10 Green Point Stadium – O Legado FIFA do jogo desleal 
Mondli Hlatshwayo e Michael Blake 
11 Contando vantagem – Dissecação da lenda urbana do legado de desenvolvimento do Moses Mabhida Stadium de Durban 
Aisha Bahadur 
12 Mbombela – Corrupção, assassinato, falsas promessas e resistência 
Dale T. McKinley (com o African Eye News Service) 
13 Construindo Coliseus, vivendo em barracos – Operários na sombra da cidade mundial 
Tony Roshan Samara 
Colaboradores

Apresentação

Paulo Capela 
Elaine Tavares 
Diretores do IELA

Após a leitura desse livro não será mais possível alegar ignorância sobre os fatos e os interesses econômicos que envolvem os bastidores dos megaeventos esportivos, caracterizados por serem um grande negócio e peça da maquinaria que produz a modernização conservadora e o subdesenvolvi-mento nas nações periféricas do planeta. A tradução para a língua portuguesa do livro – South Africa’s World Cup: a legacy for whom? – viabilizada pelo IELA – Instituto de Estudos Latino-Americanos desde um de seus núcleos de pesquisa, o Vitral Latino-Americano de Educação Física, Esportes e Saúde da UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina, inaugura a parceria do nosso Instituto com nobres e qualificados pesquisadores, ativistas culturais, líderes políticos partidários, sindicalistas e intelectuais pesquisadores do continente africano, rompendo assim com a arrogância e o determinismo do pensamento único eurocêntrico e estadunidense que coloniza a América Latina por séculos. Já há inúmeros fatos que evidenciam atos de corrupção no Brasil semelhantes aos que têm sido historicamente praticados em outros países do mundo e que os autores dessa obra explicitaram de forma magistral, desvelando aos leitores as estratégias utilizadas e as nefastas consequências produzidas pela “forma negócio” do futebol, praticada pela FIFA, e que tanto mal produziu na vida do povo africano durante a realização da Copa FIFA/ 2010 naquele continente. 
Mais do que desvelar, anunciar, resistir, denunciar, essa obra estimula a organização popular daqui e de lá para exigir reparação pelas injustiças cometidas e punição aos inimigos do povo. Entendemos que obras como essa que agora vem a lume ajuda, sobremaneira, a provocar o debate com os povos de todo o planeta e orienta outros horizontes para a efetivação das práticas corporais olímpicas e para a promoção da unidade planetária através do futebol, principal prática esportiva da civilização contemporânea. 
Pensamos ser fundamental a união em escala mundial para afirmar que já existe acúmulo científico suficiente para produzir encontros esportivos, inclusive os de futebol, entre os povos do mundo. Mas, as propostas que deveriam permear esses eventos teriam de ter o compromisso de preservar a saúde dos atletas, a vida e as identidades nacionais populares dos povos. Assim, poderiam servir efetivamente de exemplo a tantos meninos e meninas que, nessas ocasiões, se espelham nos atletas. Daí a necessidade de serem práticas pautadas na vida, na cooperação, na fraternidade e na paz entre os povos. Mas, não é isso o que se vê. 
Queremos que, através da parceria afro-brasileira, iniciada durante a IX edição das Jornadas Bolivarianas, realizada em abril de 2013 na UFSC, principal evento científico do IELA, cresça um clamor latino-americano e planetário articulando os grupos críticos em um movimento pela extinção dessa forma de promover a integração das populações mundiais via esportes-mercadoria, sob o domínio e coordenação da FIFA, do COI e de suas afiliadas em territórios nacionais de todos os países. Assim, poderia ser gerada uma teia de agências interligadas para replicar os interesses antipopulares transnacionais em territórios nacionais que seguem produzindo práticas e gostos pelos esportes e lazer capitalista, antivida e promotoras do subdesenvolvimento econômico das nações. ,br. Desta forma, brindamos a efetivação de mais um trabalho do Instituto de Estudos Latino-Americanos capaz de favorecer a compreensão das práticas capitalistas necrófilas em seus variados campos da cultura humana, que, no caso em tela, debruça-se sobre a forma de apropriação capitalista do futebol, tornando-o um grande negócio a serviço de poucos. 
As energias que alimentam nossas ações e publicações emanam de todos os amigos da vida, de todos os que atuam em prol do desenvolvimento de toda a vida planetária, cujo êxito só será atingido com muita coragem, luta, cooperação e amor, na ação conjunta de superação do capitalismo. 
Agradecemos, então, a todos os que com seu trabalho contribuíram para a efetivação desse livro, publicado pelo IELA/Vitral em parceria com a Editora Insular, em especial aos colegas sul-africanos, valorosos lutadores populares, escritores e pesquisadores orgânicos das lutas dos povos. E, de forma especial, nosso agradecimento a Eddie Cottle por organizar originalmente essa obra e a sua editora africana por nos ceder os direitos de tradução para a língua portuguesa, disso que é, enfim, o resultado da luta dos trabalhadores.

Prefácio à edição sul-africana

Crecentia Mofokeng 
Representante Regional da Building and Wood 
Workers’ International(BWI), África e Oriente Médio

Este livro é o resultado de três anos de empenho, colaboração, pesquisa e luta para melhorar as condições dos operários antes, durante e após a Copa do Mundo da Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA - Fédération Internationale de Football Association) 2010. O que começou como uma tentativa de documentar as batalhas dos operários da construção transformou-se em um projeto muito maior quando ficou evidente que o desenvolvimento de um megaprojeto através do esporte é algo muito mais complexo. Em 2006 a Building and Wood Workers’ International(BWI) (Organização Internacional dos Trabalhadores da Construção Civil e Madeira) formou uma parceria com o Labour Research Service(LRS) (Serviço de Pesquisa do Trabalho) para dar suporte à campanha “Trabalho Decente para e muito além de 2010”, usando a oportunidade da Copa do Mundo de 2010 para promover condições de trabalho decente no setor de construção na África do Sul. 
Depois que a LRS analisou o impacto de megaeventos de esporte nas condições dos operários, várias novas ideias e perspectivas surgiram. A pesquisa inicialmente pretendia informar a reação dos operários e dos sindicatos na batalha para melhorar as condições dos trabalhadores, mas logo ficou claro que isso não seria possível sem que víssemos o espetáculo esportivo como um todo e o papel da FIFA na globalização do capitalismo e na acumulação. Além disso, o Global Wage Report da International Labour Organization (ILO) (Relatório sobre Salários da Organização Internacional do Trabalho Global) mostra que a participação dos operários na riqueza caiu significativamente sob a globalização neoliberal e que a desigualdade mundial aumentou. A pergunta que buscamos responder é a Copa do Mundo de 2010 produziria algo diferente além do que estava sendo suposto por seus organizadores, pelo governo da África do Sul, pelos organizadores municipais e pela mídia? Em outras palavras, os benefícios prometidos sobre o evento alcançam os sul-africanos comuns e os trabalhadores em especial? 
Havia pouca informação disponível sobre o que realmente acontece com os operários, além das promessas e reivindicações generalizadas sobre o legado duradouro do evento, pois a maioria dos estudos (até mesmo as colaborações mais importantes) é meramente focada nos legados de infra-estrutura econômica e urbana. Além disso, observando que a FIFA estava vinculada ao capital transnacional e que a Copa do Mundo era a sua raison d’être, a alegação da FIFA de que ela era uma organização beneficente teve de ser questionada, pois ela sempre relutava em se envolver nas questões que confrontavam os trabalhadores, argumentando que a FIFA não era o empregador. Sem contar que a organização exige milhares de concessões e garantias dos governos, capta e controla o comércio através dos direitos de propriedade intelectual e várias outras disposições. 
Este livro oferece uma análise geral e crítica do impacto de megaeventos esportivos, tais como a Copa do Mundo da FIFA, e o paradigma desenvolvimentista associado a ele. Também desafia todos os estudos já conhecidos e aqueles que idolatram a FIFA ao fornecer análises rigorosas e evidências concretas sobre o que era na verdade um evento esportivo espetacular destinado à acumulação maciça e à extração de riqueza da África do Sul, e contradiz as promessas de desenvolvimento e supostas perspectivas futuras para o crescimento econômico compartilhado. 
De várias formas este livro relança um debate necessário sobre os paradigmas do desenvolvimento que tem sido dominado e engolido pela hegemonia da ideologia neoliberal. É uma intervenção oportuna no desenvolvimento e no ressurgimento de um discurso esquerdista sobre o impacto de megaeventos esportivos, que se tornaram parte do ciclo “natural” de quatro anos neste período de globalização capitalista e o qual trouxe mais mudanças de desigualdade para a economia mundial, seus cidadãos e o meio ambiente. Esperamos que as lições aprendidas na África do Sul possam ser compartilhadas com os trabalhadores envolvidos nas preparações do Campeonato Europeu de Futebol da União das Federações Europeias de Futebol (UEFA – Union of European Football Associations) na Ucrânia e na Polônia em 2012 e a Copa do Mundo no Brasil em 2014, entre outros megaeventos programados para o futuro próximo.

Organizadores

Eddie Cottle – organizador deste livro, é representante oficial de campanhas e políticas da Building and Wood Workers'International (BWI).

Paulo Capela – professor do Centro de Desportos da Universidade Federal de Santa Catarina, atual Coordenador do Vitral Latino-Americano de Educação Física, Esportes e Saúde e ex-presidente do Instituto de Estudos Latino-Americanos, ambos da UFSC.

André Furlan Meirinho – MBA em Desenvolvimento Regional Sustentável pela UNB, mestrando em Planejamento e Desenvolvimento Territorial Sócio-Ambiental na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).

sexta-feira, 9 de maio de 2014

POR UMA CAPOEIRA SEM SENHORES

Convidados de audiência reagem a projeto que reconhece capoeira como profissãoEnviar notícia por e-mailImprimir

Gorette Brandão
Audiência pública realizada pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE), nesta quarta-feira (7), revelou divergências em relação a projeto de lei destinado a reconhecer a prática da capoeira como profissão. Para a maioria dos convidados, a proposta em exame (PLC 31/2009), vinda da Câmara dos Deputados, reduz uma prática cultural complexa a um esporte, além de impor um modelo de organização federativa sem garantia de transparência, que poderá trazer a exclusão de mestres formados dentro da tradição e que conquistam o título por reconhecimento dos próprios praticantes.
A visão predominante é de que regulamentação só será legítima se reconhecer a capoeira como atividade multidimensional - ao mesmo tempo luta, dança e arte - além de fator de socialização, criação de identidade e de transmissão de memória ancestral.
Para Alexandro Reis, diretor da Fundação Cultural Palmares, no momento em que o país vem adotando ações afirmativas no campo da educação e em favor dos quilombolas, esse deve ser o enfoque para a capoeira, cabendo aos praticantes construir uma ação unitária e provocar o Estado a agir na direção certa.
– O Estado tem uma dívida com os capoeiristas e com a cultura afrobrasileira – afirmou.
O debate foi sugerido pelos senadores Inácio Arruda (PCdoB-CE) e Lídice da Mata (PSB-BA). A senadora, que também presidiu a audiência, é a relatora do projeto, do deputado Arnaldo Faria de Sá (PSDB-SP), na Comissão de Educação. O projeto reconhece a prática da capoeira como profissão, na sua manifestação como dança, competição ou luta, considerando o capoeirista um atleta profissional.
Escolha
Reginaldo da Silveira Costa, mestre de capoeira (batizado Squisito) e educador, defendeu como alternativa um modelo de organização que não afete o “princípio da liberdade de escolha”. Prevalecendo o sistema sugerido pelo projeto, conforme assinalou, todos os mestres deverão ser filiados e homologados por um conselho, a seu ver um critério que “arrepia” o capoeirista e suas tradições.
- Lutamos séculos contra a hegemonia de qualquer tipo de senhor, de qualquer tipo de dominação, para chegar a um tempo em que a gente cria uma lei que nos engessará perante a uma determinada instituição. Essa é a questão mais assustadora - disse.
Representante do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a diretora Célia Maria Corsino explicou que, com o reconhecimento da capoeira como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, em julho de 2008, a roda de capoeira e o ofício de mestre foram inscritos no Registro dos Ofícios e Mestres de Saberes. Mesmo com a ressalva de que não é papel do órgão apoiar ou não o projeto, ela afirmou que a profissão a ser criada de fato não pode desconsiderar a complexa dimensão cultural e social da capoeira.
Dentro das responsabilidades do órgão de incentivar e proteger os bens culturais reconhecidos, no caso da capoeira o Iphan deve lançar ainda esse ano um edital de premiação para os mestres de capoeira, como informou a diretora. O órgão também participa de comitê que está trabalhando para assegurar o reconhecimento da roda de capoeira, pela Unesco, como bem imaterial da humanidade. Além disso, ela disse que, por meio de suas representações estaduais, o Iphan está identificando e buscando o diálogo com grupos de capoeira de todo o país, saindo do foco “Bahia-Rio de Janeiro”.
- A gente pensa que não, mas a capoeira está em todo o Brasil – afirmou.
Mesmo sem fazer clara defesa do projeto, o presidente da Confederação Brasileira de Capoeira (CBC), Gersonildo Heleno de Sousa, foi o único na mesa a enfatizar como urgente a institucionalização da profissão. Como explicou, isso irá solucionar o problema da proteção previdenciária, além de fortalecer os campeonatos e a criação de ranking nacional de capoeiristas, um critério para a concessão da bolsa-esporte aos atletas.
- Nossa ideia é também buscar a profissionalização para afastar os falsos mestres [de capoeira]. Hoje parece que todo mundo é mestre – comentou Gersonildo.
Já Hélio Tabosa de Moraes, o mestre Tabosa, disse que não se preocupa com a questão dos “falsos mestres”. Segundo ele, o reconhecimento vem da comunidade e, se ele não existir, o pretenso mestre “não vai longe”. Para ele, há motivos mais sérios para que se fique com um “pé atrás”, posição de defesa na ginga da capoeira. O principal seria em relação a como se fará a destinação dos recursos que o projeto destina à atividade, o equivalente a 2% da arrecadação das loterias, que tendem a ser atribuídos à atual federação.
- Esta instituição passa a ser a única a ter direito ao acesso a esses recursos e isso praticamente diz quais são os objetivos que o projeto em si busca e que são lesivos aos interesses maiores da capoeira, da cultura e da sociedade – afirmou.
Sem pressa
Depois da longa discussão, Lídice da Mata esclareceu que, diante das controvérsias, ela não terá pressa em apresentar o relatório com sua posição sobre o projeto. Disse que o assunto é complexo e precisa ser bem amadurecido. Observou que isso é ainda mais importante porque, devidos a restrições constitucionais, o Supremo Tribunal Federal tem sido rigoroso no tratamento de ações a respeito de profissões. Por esse motivo, ressaltou Lídice, os mais recentes projetos para regulamentar atividades estão sendo vetados quando chegam para sanção presidencial.
- Por isso tudo é necessário caminhar devagar.  Além disso, toda regulamentação significa restrição ao exercício da atividade – disse a senadora, ao reconhecer também esse ponto como mais um motivo de cautela.
Lídice, que recentemente esteve em Salvador para uma audiência da comissão sobre a matéria, observou ainda a necessidade de ouvir grupos e praticantes de capoeira de todo o país. Observou que há restrições orçamentárias para que se faça uma audiência em cada estado, mas lembrou que as contribuições podem ser enviadas pelos canais interativos do Senado pelo portal na internet. Também adiantou que deverá aproveitar o trabalho de consulta que o Iphan está promovendo.
A senadora, numa exceção às regras, deu voz a um conjunto de ouvintes da audiência, entre eles Zulu Araújo, ex-presidente da Fundação Palmares. Ele destacou que o projeto não é a primeira ameaça à tradição cultural da capoeira. Lembrou que há alguns anos o Conselho Federal de Educação Física instruiu suas regionais a exigirem diploma de curso superior para quem ensinasse capoeira, além de cobrar contribuição ao órgão.
Para afastar o risco, naquele momento o então ministro da Cultura Gilberto Gil formou um grupo de trabalho, do qual fez parte. Como resultado desse trabalho, depois se encaminhou ao Iphan o pedido para que a capoeira fosse reconhecida como patrimônio cultural imaterial.